domingo, 4 de dezembro de 2011

Filósofo da bola

(Foto: Divulgação)
Não era apenas mais uma tarde quente de outubro. Aquela sexta-feira me reservava inúmeras emoções. Muitas delas eu viveria algumas horas mais tarde, no Morumbi. E não falo de futebol. O Rush estava no Brasil.

Eu e mais alguns amigos partiríamos para São Paulo ao meio dia. Encontramo-nos em um posto de gasolina à espera da van. A ansiedade era tamanha que não me dei conta de que Sócrates também estava ali. Observei por alguns segundos até que caísse a ficha.

Odeio tietagem. Mas a presença do Doutor, tão perto, tão acessível, me forçou a cumprimentá-lo. Gaguejei, tremi. Era Sócrates, o Magrão. Da Seleção de 82, da Democracia Corintiana. Troquei meia dúzia de palavras e permaneci incrédulo por mais meia dúzia de minutos. 

Lembro que ele não conseguiu compreender a idolatria. “Vocês são muito novinhos, não me viram jogar.” De fato, nasci dois anos após sua aposentadoria. Mas não falamos de Zé, de Joãozinho. Falamos de Sócrates. Alguém que não entendeu, do alto de sua humildade, o porquê de alguns jovens de menos de vinte anos o bajularem.

Hoje, parei em frente ao computador e fiquei estarrecido com a notícia de sua morte. Senti um vazio. O futebol também. Pensei, imediatamente, no abraço que recebi naquela tarde quente de outubro. Pensei nas coisas que quis dizer, mas não consegui. Pensei, sobretudo, nas poucas palavras que ele me disse.

Sócrates se foi. Talvez sem perceber sua grandeza. Questionando-se sobre o motivo de ser citado em livros de História do Brasil. Sem entender por que transcendeu décadas.

Sabia, porém, de sua importância. Assim como sabia o que dizer quando ninguém podia dizê-lo. Mais do que doutor, professor, ensinou cidadania e liberdade. Foi, como Clístenes, na Atenas de outro Sócrates, pai da Democracia. Filósofo da bola, jogador da filosofia.

Foi cedo, vítima dos estragos de um vício. Deixou a graça de seu mágico calcanhar para o futebol, a força de sua ideologia para a política. Uma espécie de anti-herói, que, pode-se dizer, salvou um time e contribuiu com uma nação. Uma nação que não se resume à corintiana. Porque, antes de corintiano, foi brasileiro.

Sócrates Brasileiro Sampaio de Souza Vieira de Oliveira. Que deixou a vida num domingo em que seu país é democrático e seu time, campeão. Um presente do futebol para o mestre que tanto presenteou os torcedores. 

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