sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Quando o dinheiro fala mais alto


            O jovem Tatá jogava na divisão de base de um grande clube profissional. O sucesso do seu futuro era certo, o menino encantava nos gramados. Pouco tempo depois de subir para o time profissional, já era reconhecido nacionalmente. Então, recebeu uma proposta para jogar no Al Adin, dos Emirados Árabes, para ganhar 13 vezes mais do que ganhava aqui. Resolveu acertar com o clube.

            Já o não tão jovem Romério, apesar do talento, preferiu ficar no Brasil. Mas não se fixou em um único clube. A cada proposta de aumento de salário, o jogador se transferia para um time rival. Resultado: rodou por todas as equipes da cidade, foi amado e, principalmente, odiado.

            Casos como o de Tatá são cada vez mais comuns no esporte mais famoso do mundo. Kaká, Robinho e Alexandre Pato são exemplos de atletas que saíram cedo do país para brilhar (e ganhar mais) fora do Brasil. Neymar tem tudo para ser o próximo a entrar na lista. O atacante só continua no Santos porque o clube pagou por sua permanência. Hoje o garoto recebe salário de gente grande.


Com 18 anos, Pato já estava jogando no Milan (Foto: Divulgação)

            Histórias parecidas com a de Romério também aparecem pelo mundo todo. Romário, Edílson, Figo e Ibrahimovic trocaram o time que estavam atuando pelo principal rival. Recentemente, a torcida gremista lotou o Olímpico só para vaiar Ronaldinho Gaúcho. O meia preferiu ir para o Flamengo do que voltar para Grêmio, porque o time carioca pagou mais. Outro caso que circulou pela mídia foi quando as camisas de Carlitos Tevez estavam sendo arrecadadas em um caminhão de lixo pela cidade de Manchester. Tevez ganhou o ódio dos torcedores do United e do City. Do primeiro, por ter se transferido para o clube rival. Do segundo, por ter se recusado a entrar em campo em uma partida. Carlitos e os outros “vira-casacas” sabiam da fama de traíra que iriam receber. Mas mesmo assim resolveram pagar o preço, justamente porque teriam muito dinheiro para pagar esse preço.

Luis Figo foi negociado diretamente do Barcelona para o Real Madrid (Foto: Divulgação)

Os tempos mudaram, o futebol virou negócio, os clubes viraram empresas e os jogadores agora são empregados. A maioria dos atletas das copas de 50, 54, 58 morreram na miséria. Hoje, qualquer jogador mediano ganha mais de 5 mil reais. E como qualquer outro empregado, os jogadores querem crescer, melhorar e ganhar mais. A grande questão é: isso é natural ou errado?

A resposta é difícil. De um lado o atleta deve entender que jogador de futebol não é uma profissão como outra qualquer. O futebol é irracional, irradia paixões e move milhares de corações. O torcedor irracional e apaixonado espera que o jogador faça seu trabalho, cumpra seu contrato, ou, no mínimo, nunca jogue no clube rival. Existe uma certa “ética” envolvendo o futebol, que não está escrita em nenhum lugar, mas que todos devem conhecer. Essa tal “ética” diz que o atleta que mudar de time (e se o time for um rival, a situação é ainda mais grave) para ganhar mais será considerado mercenário.

            Do outro lado, os torcedores devem entender que quem ama o clube é o torcedor e não o jogador. Deve entender que o futebol é o ganha-pão dos jogadores. E como qualquer outro empregado, apesar dos apesares já citados, o jogador tem todo o direito de aceitar uma proposta por um salário melhor. Se o torcedor comum, que trabalha de segunda a sábado, recebesse uma proposta de uma empresa oferecendo 10 vezes mais do que ele recebe atualmente, com certeza ele aceitaria o novo emprego.


Ronaldinho Gaúcho: mercenário ou funcionário? (Foto: Hector Werlang)

Casos como Rogério Ceni e Marcos, que passam toda a carreira no mesmo clube, são cada vez mais raros. Não se joga mais por amor e sim por dinheiro. Mas não há nada mau nisso, é simplesmente uma consequência natural do progresso do mundo capitalista. Diante desse contexto, é preciso entender os dois lados da moeda. Não se pode julgar o jogador que quer ganhar mais e não se pode tirar o direito do torcedor de chamá-lo de mercenário. Mas aconteça o que acontecer, sempre restará a esperança de que surjam mais jogadores que joguem por amor à camisa, fazendo a emoção superar a razão.

@renanfantinato

Um comentário:

  1. Será que daqui, 30, 40 anos, quando velhinhos, quem estará mais feliz com o que fizeram no futebol? Marcos e Ceni ou Tevez, por exemplo?

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