quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Novela e Ipanema


Praia de Ipanema (Foto: Divulgação)
Enquanto os jornais anunciavam o fim da novela e se aprumavam as ferrenhas discussões sobre o destino de Thiago Neves, dois quarentões cariocas vestiam os bermudões e as camisetas, que, devido às barrigas voluptuosas, penduravam-se nos umbigos. A desculpa era entornar algumas garrafas de cerveja na Vieira Souto, em frente à praia de Ipanema. Ambos, entretanto, afiavam suas agulhas para cutucarem um ao outro.

Um deles, beirando os cinquenta anos, com cabelos grisalhos dominando a cabeça, era flamenguista fanático. Estrebuchara com a decisão de que o jogador iria para o arquirrival Fluminense. “Mermão, cansei desses mercenários. Em 2008, com aquela história do Palmeiras e do Flu, o cara já mostrou que só quer saber de dinheiro. Onde oferecem mais, ele fica”, desabafava enquanto sentava na mesa e chacoalhava o dedo para o garçom, pedindo a primeira do dia. 

“Tu tem que entender que futebol já não é mais assim, essa coisa romântica. O cara não quer mais ficar num clube por amor à camisa. Tem que fazer o negócio funcionar, mané.” A frase veio em tom de consolo ao amigo, que esperara um acerto de Thiago Neves com o rubro-negro nos últimos dias. 

Horas e goles davam espaço a infindáveis argumentos. Inspirados pela recente polêmica, falavam sobre o futebol como empresa e como paixão, e sobre algum lugar nebuloso e híbrido entre os dois. O que vestia a camisa do Flu acendeu um cigarro, como um gesto de preparação, e expôs o que lhe parecia cabível. “Pô, eu não admiro a atitude dele. Se fosse comigo eu ia ficar puto também. Só que, cara, que jogador não pensa assim? Se for pensar, tem um ou dois que levam em conta a paixão pelo time e esquecem o dinheiro. E não é só no futebol. Quem é que não pensa no dinheiro?”. 

O outro coçou a cabeça e pensou por alguns instantes. “Não vou aceitar que todo jogador tem razão em pensar só no dinheiro. Tu consegue trabalhar com o que não gosta? É a merma coisa. Porra, o cara tem que ser muito mercenário pra ficar num lugar só pelo salário. E aí tem um problema maior. Futebol deixou de ser amor e hoje é só negócio. Esses moleques ganham mais do que, sei lá, noventa por cento da população brasileira.” 

Entre saudosismos e vanguardismos, a tarde caiu e a conversa finalmente tomou outros rumos. Só o que ficou foram as opiniões divergentes sobre a legitimidade de uma decisão como a de Thiago Neves. A novela despertou as argumentações em todo canto onde estão rubro-negros, tricolores ou aqueles que se sentem despertos pela bola rolando.

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