segunda-feira, 5 de março de 2012

A bola parou?


Quem sobe mais alto? (Foto: Uol)
Um atacante habilidoso tem a bola nas proximidades da área adversária. Ele pode tentar uma jogada de efeito, mas seu objetivo é outro: cavar uma falta. Depois de duas ou três pedaladas e um pulo teatral, ele atinge sua meta: falta perigosa. O experiente meia da equipe se prepara para a cobrança. A torcida fica eufórica. Cinco jogadores estão na área, esperando um possível cruzamento. A bola é alçada na cabeça do zagueiro de quase dois metros de altura. Ele faz um cabeceio preciso e marca mais um gol no torneio, aproximando-se da artilharia da equipe no campeonato.

Essa cena está se tornando cada vez mais frequente nas competições nacionais. Faltas, cruzamentos, bolas paradas, cabeceios tornaram-se as principais armas ofensivas das equipes brasileiras. Uma pesquisa da Folha de São Paulo (de 18/02/12) mostra que a porcentagem de gols de cabeça dos times paulistas é a mais alta dos últimos tempos:

Foto: Folha de S. Paulo


A mesma pesquisa também aponta que a bola parada indireta (que inclui rebotes e cruzamentos) também bate récordes no início deste ano: 19,9% dos gols foram marcados dessa forma. Assim, quase metade das bolas que balançam as redes tem origem em bolas paradas, cruzamentos ou rebotes.

Engana-se quem acredita que esse tipo de jogada só é referência para os times considerados pequenos. Nos últimos tempos o Palmeiras tornou-se praticamente dependente da bola parada. Através dos pés de Marcos Assunção, toda falta próxima a área é sinônimo de perigo para o time adversário. Pelo menos até agora, essa "dependência" não foi prejudicial ao Verdão: mesmo sendo uma jogada conhecida, ela tem dado certo e o Palmeiras está invicto no Campeonato Paulista.

Quase metade dos gols do Palmeiras no ano passaram pelos pés de Marcos Assunção (Foto: Uol)
Porém, os constantes gols de cabeça ou de bolas paradas são frequentemente associados a um "futebol feio", uma negação ao futebol-arte. O próprio técnico do São Paulo, Emerson Leão, fez a seguinte afirmação há alguns dias: "O nível técnico caiu. As equipes estão piores. A bola parada representa uma necessidade. Quem tem bons cabeceadores e um cara que bate bem na bola leva vantagem. É esse o diferencial de hoje, já que todo mundo está igual".  
Concordo que não é bonito assistir a um bando de brutamontes lutando por espaço na área para um cabeceio. Também acho que o torcedor brasileiro sente falta de grandes jogadas e dos dribles incríveis. Mas não acredito que o excesso de bolas paradas seja um indício de que o futebol brasileiro está carente de técnica.
Foto: globoesporte.com


O maior esporte do mundo se modernizou. Sei o quão clichê isso é, mas não posso deixar de dizer: o futebol evoluiu, se modificou, se capitalizou. Nessa capitalização, os times viraram empresas e as empresas precisam de resultado. Os resultados são cobrados dos funcionários. Assim, técnicos e jogadores não querem saber se estão jogando bem, mal, bonito ou feio. O importante é ter resultados e somar pontos.

Deste modo, não podemos dizer que o nível técnico caiu. O único fenômeno que ocorreu foi a mudança de foco. Em vez de tentar as jogadas coletivas ou individuais que enchem os olhos, as equipes perceberam que a simples bola alçada na área é mais produtiva.

Vale à pena frisar também que o futebol brasileiro não vive exclusivamente de bolas paradas. O futebol-arte está longe de sair de nossas terras. Afinal, onde mesmo que aconteceu o gol mais bonito do ano de 2011? E mais, quem disse que bater faltas como se fossem pênaltis não é um tipo de futebol arte?

Quem foi que disse que não existe habilidade por aqui? (Foto: band.com.br)
Existe uma ideia que está na mente de muitos saudosistas de que "antigamente tudo era melhor". Nosso esporte não foge disso. Quantas vezes você já ouviu dizer que o futebol de hoje está morto? Guardando as devidas proporções, ninguém ousaria dizer que o Corinthians só foi campeão brasileiro em 1990 por causa da bola parada de Neto. Porém, caso o Palmeiras seja campeão, ninguém vai hesitar em dizer que o Marcos Assunção foi o responsável pelo título. Não estou comparando um com o outro. Nem quero saber qual time dependeu mais de seu jogador. Só defendo que ambos tiveram excelentes cobradores de falta e conseguiram resultados expressivos com a ajuda deles, ponto.

O que ganha campeonato são os pontos conquistados, seja de forma bonita ou não. O torcedor  prefere muito mais ver seu time ser campeão com  milhares de gols de cabeça, do que  ver sua equipe jogando bonito mas não ganhando nada.

Mesmo com bola parada, o espetáculo continua rolando. E se pararmos para pensar, veremos que ainda rola magia no futebol. E sempre irá rolar. 

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