por Maria
Tebet
Caro colega,
A fome pela degola prevaleceu sobre a tolerância brasileira: é uma
constante do futebol nacional que a cada ano vem mais sólida e arraigada em nossos
hábitos futebolísticos. Bem como o senhor deve saber, já foram sete treinadores
só neste Brasileiro de meio de ano. Acredito que ontem o dia foi bem animado,
mesmo. Você demitido, sendo substituído por Dorival, que acabou de deixar o
Internacional, que nesta quarta viaja para Santa Catarina para enfrentar o
Figueira, time desde ontem com um novo treinador, Hélio do Anjos, ex do
Atlético-GO. O Figueirense deu adeus a Argel, assim como o São Paulo dispôs a
Leão, e o Bahia a Falcão suas devidas despedidas.
É, o senhor já estava queimado mesmo. Há muitos que não o levam a
sério, até quando suas entrevistas não estão em língua estrangeira. Sei que
considerou parar de vez. Nestas horas em que tudo está 'assando', coisas do
tipo começam facilmente a passar pela cabeça. Mas tenho certa convicção que
deixar o seu clube por espontânea vontade não era uma opção sua. Para remontar
e por ordem em uma equipe é preciso tempo, concordo. Parece porém que o peso da
camisa e da pressão dos torcedores mais diretoria não estavam dispostos a
esperá-lo.
Os estrangeiros podem até ter motivos para não considerar
plenamente seu trabalho. Pode até ser pelo sotaque ou piadas a respeito de seu
inglês, mas o fato é que sua breve saída do futebol nacional para assumir a
Seleção da África do Sul não foi lá memorável. Levar a seleção às semifinais da
Copa das Confederações foi sim um feito e tanto. Mas o fim da viagem overseas
- pronúncia livre - já se mostrava próximo após o decorrer da pré-competição,
quando sofreu uma série de derrotas. A volta para o Brasil a menos de um
ano da Copa do Mundo foi, nestas condições, aceitável.
Entendo que sua prévia experiência tenha deixado marcas. Depois da
conquista do carioca pelo Flamengo, perder para o América do México nas oitavas
e ser eliminado da Libertadores não foi coisa fácil. Nunca é. E antes então,
sua curta passagem de dois meses no Fluminense em 2007, Brasiliense em 2005,
Guarani e Inter no ano anterior, 2001 com Coritiba, e Corinthians em 97. Pois
é, assim como em qualquer carreira de treinador, há passagens breves, apagadas
ou infelizes.
Mas nem tudo é trivial ou motivo de chacota em sua carreira.
Subestimar com fervor seu método e sua personalidade é quase como acreditar em
Papai Noel. É como acreditar que o senhor, por pura sorte, passou invicto pelos
nove jogos necessários para a permanência do Flamengo na primeira divisão do
Brasileiro. Ou pensar que foi Noel quem tirou o mesmo time carioca da degola e
o mandou para a Libertadores. Mesmo com outros fatores na conta, sua parcela
deve ser - por que não? - guardada embaixo da árvore. Assim como seu trabalho
de recuperação e conciliação, que já é, talvez, uma de suas 'marcas
registradas'.
Acontece que sendo ruim ou bom treinador, adorado, odiado ou
irrelevante, sua vez sempre e a qualquer momento pode 'rodar'. O baile dos
técnicos não é só para os times vips em má situação no
campeonato, como no Inter de Dorival, que caiu em sua segunda derrota e sobre o
líder, ou o Atlético-GO de Adílson, que estava invicto até então. Mas, aceite,
o Flamengo já não vinha bem na temporada - não passou na fase de grupos da
Libertadores e não conseguiu uma final de turno no Carioca. E só um verdadeiro
Noel para dizer se é realmente tempo que o Flamengo precisa. Uma possível
verdade, chego quase à conclusão, é que a diretoria rubro-negra cansou de
segurá-lo, e era previsível que quisessem o quanto antes trocar - sem
mal-entendidos - sua 'braçadeira' de treinador.
Tudo bem que a cadeira lá na Gávea não para 'quieta', com todo
respeito à expressão. Ouvi uma vez alguém dizendo: desde 2003, 22
treinadores já passaram pelo clube. Informação esta digna de prancheta. Só o
senhor, soma cinco vezes: vai ser mesmo difícil eles esquecerem seu nome.
Já no encerramento de meu - um tanto cansativo - discurso, faço
uma consideração. Foi uma pena Riquelme não aceitar ser o seu mais 'novo' 'filho
adotivo', após ver a derrota para o Corinthians por 3 a 0. Se
tivesse fechado o negócio, talvez o senhor poderia permanecer no cargo - se é
que a essa altura isso adiantaria alguma coisa.
Dono de um bom astral e fornecedor de muitas risadas, sei que o
senhor procura sempre transparência em tudo que faz e recebe. Portanto, estou,
desde o princípio, sendo sincero. Ressalto que está certo quando diz que é mais
fácil procurar os culpados quando a situação foge do controle. Hoje, não sei
quem é mais culpado e do que o é. Como tentei me colocar acima, talvez o
Flamengo estava disposto a pagar para dançar no baile mais uma vez. Ou talvez,
o senhor não alcançou a credibilidade e confiança que gostaria, com os
torcedores ou/e diretoria.
E agora, um futuro incerto para mais um treinador brasileiro, um
'Papai' com a possibilidade de passar o Dia dos Pais desempregado. Se sua
inatividade não se estender até o dia de seu aniversário, será um lucro e
também um presente. O jeito, então, é esperar... Pode ser, senhor Papai
Joel?
Grande abraço.
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