terça-feira, 24 de julho de 2012

To Joel


Caro colega, 

A fome pela degola prevaleceu sobre a tolerância brasileira: é uma constante do futebol nacional que a cada ano vem mais sólida e arraigada em nossos hábitos futebolísticos. Bem como o senhor deve saber, já foram sete treinadores só neste Brasileiro de meio de ano. Acredito que ontem o dia foi bem animado, mesmo. Você demitido, sendo substituído por Dorival, que acabou de deixar o Internacional, que nesta quarta viaja para Santa Catarina para enfrentar o Figueira, time desde ontem com um novo treinador, Hélio do Anjos, ex do Atlético-GO. O Figueirense deu adeus a Argel, assim como o São Paulo dispôs a Leão, e o Bahia a Falcão suas devidas despedidas. 

É, o senhor já estava queimado mesmo. Há muitos que não o levam a sério, até quando suas entrevistas não estão em língua estrangeira. Sei que considerou parar de vez. Nestas horas em que tudo está 'assando', coisas do tipo começam facilmente a passar pela cabeça. Mas tenho certa convicção que deixar o seu clube por espontânea vontade não era uma opção sua. Para remontar e por ordem em uma equipe é preciso tempo, concordo. Parece porém que o peso da camisa e da pressão dos torcedores mais diretoria não estavam dispostos a esperá-lo. 

Os estrangeiros podem até ter motivos para não considerar plenamente seu trabalho. Pode até ser pelo sotaque ou piadas a respeito de seu inglês, mas o fato é que sua breve saída do futebol nacional para assumir a Seleção da África do Sul não foi lá memorável. Levar a seleção às semifinais da Copa das Confederações foi sim um feito e tanto. Mas o fim da viagem overseas  - pronúncia livre - já se mostrava próximo após o decorrer da pré-competição, quando sofreu uma série de derrotas.  A volta para o Brasil a menos de um ano da Copa do Mundo foi, nestas condições, aceitável.  

Entendo que sua prévia experiência tenha deixado marcas. Depois da conquista do carioca pelo Flamengo, perder para o América do México nas oitavas e ser eliminado da Libertadores não foi coisa fácil. Nunca é. E antes então, sua curta passagem de dois meses no Fluminense em 2007, Brasiliense em 2005, Guarani e Inter no ano anterior, 2001 com Coritiba, e Corinthians em 97. Pois é, assim como em qualquer carreira de treinador, há passagens breves, apagadas ou infelizes. 

Mas nem tudo é trivial ou motivo de chacota em sua carreira. Subestimar com fervor seu método e sua personalidade é quase como acreditar em Papai Noel. É como acreditar que o senhor, por pura sorte, passou invicto pelos nove jogos necessários para a permanência do Flamengo na primeira divisão do Brasileiro. Ou pensar que foi Noel quem tirou o mesmo time carioca da degola e o mandou para a Libertadores. Mesmo com outros fatores na conta, sua parcela deve ser - por que não? - guardada embaixo da árvore. Assim como seu trabalho de recuperação e conciliação, que já é, talvez, uma de suas 'marcas registradas'.

Acontece que sendo ruim ou bom treinador, adorado, odiado ou irrelevante, sua vez sempre e a qualquer momento pode 'rodar'. O baile dos técnicos não é para os times vips em má situação no campeonato, como no Inter de Dorival, que caiu em sua segunda derrota e sobre o líder, ou o Atlético-GO de Adílson, que estava invicto até então. Mas, aceite, o Flamengo já não vinha bem na temporada - não passou na fase de grupos da Libertadores e não conseguiu uma final de turno no Carioca. E só um verdadeiro Noel para dizer se é realmente tempo que o Flamengo precisa. Uma possível verdade, chego quase à conclusão,  é que a diretoria rubro-negra cansou de segurá-lo, e era previsível que quisessem o quanto antes trocar - sem mal-entendidos - sua 'braçadeira' de treinador. 

Tudo bem que a cadeira lá na Gávea não para 'quieta', com todo respeito à expressão. Ouvi uma vez alguém dizendo: desde 2003, 22 treinadores já passaram pelo clube. Informação esta digna de prancheta. Só o senhor, soma cinco vezes: vai ser mesmo difícil eles esquecerem seu nome. 

Já no encerramento de meu - um tanto cansativo - discurso, faço uma consideração. Foi uma pena Riquelme não aceitar ser o seu mais 'novo' 'filho adotivo', após ver a derrota para o Corinthians  por 3 a 0. Se tivesse fechado o negócio, talvez o senhor poderia permanecer no cargo - se é que a essa altura isso adiantaria alguma coisa. 

Dono de um bom astral e fornecedor de muitas risadas, sei que o senhor procura sempre transparência em tudo que faz e recebe. Portanto, estou, desde o princípio, sendo sincero. Ressalto que está certo quando diz que é mais fácil procurar os culpados quando a situação foge do controle. Hoje, não sei quem é mais culpado e do que o é. Como tentei me colocar acima, talvez o Flamengo estava disposto a pagar para dançar no baile mais uma vez. Ou talvez, o senhor não alcançou a credibilidade e confiança que gostaria, com os torcedores ou/e diretoria.

E agora, um futuro incerto para mais um treinador brasileiro, um 'Papai' com a possibilidade de passar o Dia dos Pais desempregado. Se sua inatividade não se estender até o dia de seu aniversário, será um lucro e também um presente. O jeito, então, é esperar... Pode ser, senhor Papai Joel?  


Grande abraço.




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